quinta-feira, 22 de julho de 2010

Sopa de Pedra!

Aquele homem estranho batia de porta em porta na esperança de encontrar alguém que lhe partilhasse um prato de comida. Sua some era intensa. Mas parece que deu azar, já que naquela rua só viviam pessoas muito pobres. Ninguém tinha nada para partilhar. Nem comida nem tempo. Alguns eram tão pobres que não tinham nem um “bom-dia!” para responder. Apesar de tão pobres, os moradores daquela rua viviam sempre agitados. Alguns nem abriam a porta, por medo de perder o que não tinham.

A sorte daquele barbudinho estranho foi uma bondosa velhinha que teve a coragem de lhe abrir o portão, acolhê-lo com carinho e se desculpar, pois a única coisa que tinha para oferecer era um copo com água.

- Um copo com água. Que maravilha! Então a senhora tem água em casa? É tudo o que eu precisava para fazer uma sopa de pedra.

- Sopa de pedra? Nunca ouvi falar que era possível fazer uma sopa com pedras.

- Mas é possível. Eu tenho uma pedra especial que sempre me acompanha. Quando a fome é muito grande, faço uma sopa deliciosa. Só preciso de uma panela grande, um pouco de água limpa e um lugar pra fazer fogo.

- Mas isso eu tenho. Se o senhor quiser fazer a tal sopa de pedra. Tenho uma panela enorme, que ganhei de minha avó. Tenho água limpa e pura que tiro do poço. E meu fogão a lenha está aceso e pronto para ser usado. Se o senhor quiser entrar, por favor.

O estranho homem, com muita alegria, entrou na casa daquela bondosa senhora. Pediu licença e foi lavar a grande panela, na qual faria a deliciosa sopa. Enquanto isso a senhora não perdeu tempo em avisar duas ou três vizinhas sobre a presença do estranho em sua casa. É claro que cada vizinha se encarregou de avisar outras duas ou três. Em dois minutos, dezoito vizinhas estavam aglomeradas ao redor daquele homem, para o qual, minutos antes, haviam recusado um prato de comida.

Todas estavam curiosas para descobrir a receita da sopa de pedra. O homem parecia não se importar com a presença de tantas mulheres cochichando ao seu redor. Continuava preparando a enorme panela, que, depois de muito bem lavada, foi levada ao fogo, contendo uns cinco litros de água. O homem colocou a tampa e ficou esperando alguns minutos, até que a água começasse a ferver. Enquanto a água ia se aquecendo sobre o fogo, o homem continuava lavando a pedrinha branca, do tamanho de um ovo de codorna. Após alguns minutos introduziu, com muito cuidado, a pedrinha no fundo da panela. Novamente colocou a tampa e ficou esperando.

O grupo de senhoras estava ficando inquieto. Os comentários eram os mais estranhos possíveis. Algumas nem se conheciam, apesar de viverem tão próximas. Nessas horas, é como um velório de gente pobre, todos se tornam amigos e solidários. Uma ia apresentando a outra, mas o assunto principal era a presença do estranho visitante. Uma delas disse que estava arrependida por não ter oferecido a própria casa. Ele tinha passado antes lá, mas ela ficou apreensiva. O homem era estranho e esquisito. Poderia até ser um ladrão. Sorte que a dona da casa onde estava acontecendo a reunião não tinha nada para ser roubado, por isso não teve medo de convidar o estranho para entrar.

Quem tem seus valores guardados dentro do coração não precisa nunca temer a presença de ladrões. O ladrão só consegue roubar aquilo que temos fora de nós. Esse é uma grande vantagem de quem é simples e pobre. Não se sente ameaçado o tempo todo.

O estranho novamente abriu a tampa da panela e, com uma grande colher de pau, tirou um pouco da sopa de pedra e colocou na palma da própria mão. Depois deu uma lambida, fechou os olhos e saboreou suave e demoradamente a sopa. Lambeu a mão novamente e, com muita calma, disse ao grupo de senhoras que se silenciou para ver melhor o homem experimentar a milagrosa sopa.

- Se tivesse um pouco de sal, o gosto ficaria bem melhor.

- Tenho sal em casa, se o senhor quiser posso ir buscar um pouco – ofereceu a vizinha que morava bem ao lado.

- Por Favor, minha senhora. A sopa só fica boa se o tempero for na medida certa.

Colocado o sal que a prestimosa vizinha trouxe em questão de segundos, o homem esperou mais alguns minutos para novamente provar a milagrosa sopa.

- O sal está na quantidade correta. A sopa ficaria melhor se pudéssemos reforçá-la com alguns legumes ou um pouco de carne moída.

- Tenho algumas batatas – disse uma das senhoras.

- Tenho cebolas e cenouras – disse outra.

- Em casa sobrou um pouco de carne moída...

- Eu tenho três raízes de mandioca.

- Se as senhoras quiserem contribuir para melhorar o sabor da sopa de pedra, ficarei muito grato.

Cada uma correu para casa e voltou rapidamente trazendo batatas, cenouras, cebola, carne moída, mandioca e até um pouco do delicioso fubá de milho. Tudo foi sendo entregue ao homem, que delicadamente lavava, descascava, picava e colocava dentro da panela, para dar mais substância à milagrosa sopa de pedra.

Não demorou muito e o cozinheiro avisou.

- Podem preparar os pratos que em poucos minutos lhes servirei a mais deliciosa de todas as sopas que as senhoras já saborearam.

Mais uma vez a solidariedade entrou em ação. Como naquela casa não havia pratos para todas, algumas se prontificaram a buscar pratos e talheres em casa, enquanto as outras improvisavam uma enorme mesa na varanda da cozinha.

Ficou bonita aquela cena. Quase vinte senhoras, jovens, adultas e mais idosas, sentadas parecendo meninas esperando a merenda escolar. A ansiedade era imensa. Nunca tinham saboreado uma sopa de pedra. A primeira vez é sempre emocionante.

E veio o estranho cozinheiro, com um avental improvisado, trazendo o panelão de sopa de pedra. Cada uma das presentes ia apresentando o prato, que ele servia com alegria e generosidade. A sopa tinha um aspecto maravilhoso. O fubá deu um colorido especial aos legumes. E o sabor? Incomparável. Ele nem tinha terminado de servir a última e as primeiras já estavam com o prato vazio, esperando mais.

Enquanto saboreavam aquela sopa maravilhosa, os comentários eram melhores do que a sopa:
- Nunca tomei uma sopa tão gostosa!

- Nunca pensei que era possível fazer sopa de pedras...

- Nem eu! E olha que coisa curiosa: moro nesta rua há quase quinze anos e esta é a primeira vez que visito a sua casa.

- Que bom! Agora a senhora aprendeu o caminho, poderá vir muitas vezes.

-Imagine quando os maridos souberem da novidade!

- Aliás, podíamos repetir a dose, no próximo sábado, com a presença dos maridos e dos filhos.

- É verdade. Podemos pedir ao nosso cozinheiro que nos prepare a sopa. Nós o ajudaremos. Enquanto isso nossos maridos podem fazer uma boa limpeza na rua, que está medonha de feia.

- Boa ideia. Vamos fazer um mutirão regado a sopa de pedra, no próximo sábado.

- Mas será que nosso cozinheiro poderá ficar aqui até no sábado?

- É muito fácil de saber. Alguém vá até a cozinha e pergunte a ele.

Duas delas de levantaram e foram até a cozinha para falar com o homem estranho. E ele era mesmo, tanto que tinha desaparecido. Procuraram pela casa toda. Olharam na rua. Nada. O homem tinha sumido. Quando voltavam para dar a notícia às companheiras, viram sobre a mesa da cozinha uma pedrinha branca do tamanho de um ovo de codorna. A pedra tinha sido lavada e estava colocada sobre um bilhete escrito pelo homem.

Ainda bem que uma das senhoras ali presentes sabia ler, com alguma dificuldade mas sabia. Tomou nas mãos o bilhete, pediu uns óculos emprestado e começou a leitura, quase que soletrando:


“Queridas amigas!
Fiquei feliz em encontrar senhoras tão generosas e que sabem partilhar o pouco que têm. Obrigado pelo que cada uma trouxe para nossa sopa. É isso que faz a sopa ficar gostosa. Como vocês descobriram o segredo, deixo a pedra mágica para que possam fazer saborosas sopas, muitas outras vezes.
Um grande abraço”.
Jesus de Nazaré

Esse é um dos segredos que nos ajudam a saborear a vida. Se cada um partilha o pouco que tem, conseguimos coisas maravilhosas. O mundo precisa redescobrir, com urgência urgentíssima, a maravilha da partilha, a beleza da doação, a certeza de que ninguém é pobre quando encontra alguém que tenha coragem de acolher esse estranho cozinheiro que, mais do que uma pedra, nos deixou seu próprio corpo e sangue como alimentos para a vida plena.


Trecho retirado do livro Saborear a Vida, de Pe. Léo, scj.

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